A mãe ele nunca conheceu, pois foi abandonado quando tinha apenas 1 ano de idade. Com o pai, que ele só soube quem era já no início da adolescência, não existiu nenhum tipo de vínculo social ou afetivo; o pai faleceu em 2019. Quem o menino de 16 anos realmente considera pai e mãe, na verdade, são os próprios irmãos paternos mais velhos. O adolescente tem dois irmãos adultos que, recentemente, apresentaram uma demanda bastante peculiar no núcleo da Defensoria Pública que funciona na Zona Rural de São Luís: um pedido de adoção germana.
“Quando sofreu abandono por parte dos pais biológicos, ainda criança, o menino foi encaminhado pelo Conselho Tutelar da Capital a uma casa de apoio para crianças e adolescentes em situação de risco. Esse fato acabou chegando ao conhecimento dos demais familiares, em especial desses irmãos paternos, que, visando garantir a manutenção do laço familiar, ficaram responsáveis pelo garoto desde então, e lhe proporcionaram um lar, com amor, carinho, afeto e proteção integral”, relata o defensor público.
Importante frisar que não existe, ainda, precedente no Judiciário brasileiro sobre a admissibilidade de adoção conjunta de irmãos, em favor de outro irmão, devido às vedações do artigo 42 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), que trata da adoção de crianças e adolescentes. Apesar disso, sensibilizado pela situação do menino e comovido com o pedido dos irmãos mais velhos, o defensor Alex Pacheco desenvolveu estudo e construiu tese sobre o assunto. “O intuito é, em breve, entrar com uma ação judicial. A petição está praticamente pronta. Sei que, para convencer a Justiça, ainda mais com algo inédito, imprescindível que utilizemos de todos os recursos que tenhamos à disposição”, destaca Alex Pacheco.
Requisitos e estudo de caso
No desenvolvimento da análise que fará parte da petição, o defensor se baseou nos princípios do melhor interesse e proteção integral do menor, na mutação constitucional, na evolução do conceito de família e nas relativizações excepcionais, admitidas pela jurisprudência, em analogia aos critérios para admissibilidade da chamada adoção avoenga, aquela em que avós passam a ser os responsáveis legais pela criança ou pelo adolescente.
Além disso, o titular do núcleo da Zona Rural solicitou apoio do Núcleo Psicossocial da DPE, com a realização de visitas e checagens in loco, para melhor sustentação e defesa da ação. “Nesse caso, para se admitir, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) exige a análise de diversos requisitos. Foram essas as questões que levaram à elaboração do nosso estudo”, ressalta o defensor.
Um dos pontos analisados diz respeito aos motivos que levaram os irmãos a pedir a adoção do caçula. “A pretensão da adoção é fundada em motivos legítimos. Não existem interesses sucessórios, econômicos ou fraudulentos. A motivação da adoção é apenas reconhecer um status que já existe, cujo tratamento entre adotantes e adotando é na condição de ‘pais e filho’. Não há quaisquer vantagens financeiras em favor do adotando e dos adotantes em virtude da adoção”, pontua Alex Pacheco.
Analisando as consequências da adoção para o adolescente, a Defensoria Pública considera que ela é completamente vantajosa para o menino, pois pode atender ao desejo manifesto de ter os irmãos como seus verdadeiros pais, informação que poderá passar a contar nos documentos, como a certidão de nascimento. “A adoção transformaria a família anaparental existente em família adotiva e eudemonista. A medida atenderia ao melhor interesse e proteção integral do adolescente, além de também conferir a busca da felicidade do adotando e dos adotantes”, enfatiza o defensor público.
Todas essas indagações, agora, são avaliadas e apuradas pela equipe da Defensoria Pública, para que o processo inédito tenha um desfecho feliz para a família maranhense. “Não é pela falta de precedentes que nós deixaremos de agir. A Defensoria sempre esteve ao lado de quem mais precisa, então, se for para o bem dessa criança, nós vamos à luta”, conclui o defensor Alex Pacheco.
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